Matéria publicada na Edição 3 - Novembro de 2005 - Arte e Cultura
A reflexão do artista sobre a serventia da arte descreve com aparente simplicidade o encantamento da mais enigmática produção humana e seu efeito sobre o mundo
Ferreira Gullar
A reflexão do artista sobre a serventia da arte descreve com aparente simplicidade o encantamento da mais enigmática produção humana e seu efeito sobre o mundo
Ferreira Gullar
Confesso
que, espontaneamente, nunca me coloquei esta questão: para que serve a arte?
Desde menino, quando vi as primeiras estampas coloridas no colégio (que estavam
muito longe de serem obras de arte) deixei-me encantar por elas a ponto de
querer copiá-las ou fazer alguma coisa parecida.
Não foi diferente minha reação quando li o primeiro conto, o primeiro poema e vi a primeira peça teatral. Não se tratava de nenhum Shakespeare, de nenhum Sófocles, mas fiquei encantado com aquilo. Posso deduzir daí que a arte me pareceu tacitamente necessária. Por que iria eu indagar para que serviria ela, se desde o primeiro momento me tocou, me deu prazer?
Mas se, pelo contrário, ao ver um quadro ou ao ler um poema, eles me deixassem indiferente, seria natural que perguntasse para que serviam, por que razão os haviam feito.
Então, se o que estou dizendo tem lógica, devo admitir que quem faz esse tipo de pergunta o faz por não ser tocado pela obra de arte. E, se é este o caso, cabe perguntar se a razão dessa incomunicabilidade se deve à pessoa ou à obra. Por exemplo, se você entra numa sala de exposições e o que vê são alguns fragmentos de carvão colocados no chão formando círculos ou um pedaço de papelão de dois metros de altura amarrotado tendo ao lado uma garrafa vazia, pode você manter-se indiferente àquilo e se perguntar o que levou alguém a fazê-lo. E talvez conclua que aquilo não é arte ou, se é arte, não tem razão de ser, ao menos para você.
Na verdade, a arte - em si - não serve para nada. Claro, a arte dos vitrais servia para acentuar atmosfera mística das igrejas e os afrescos as decoravam como também aos palácios. Mas não residia nesta função a razão fundamental dessas obras e, sim, na sua capacidade de deslumbrar e comover as pessoas.
Portanto, se me perguntam para que serve a arte, respondo: para tornar o mundo mais belo, mais comovente e mais humano.
Não foi diferente minha reação quando li o primeiro conto, o primeiro poema e vi a primeira peça teatral. Não se tratava de nenhum Shakespeare, de nenhum Sófocles, mas fiquei encantado com aquilo. Posso deduzir daí que a arte me pareceu tacitamente necessária. Por que iria eu indagar para que serviria ela, se desde o primeiro momento me tocou, me deu prazer?
Mas se, pelo contrário, ao ver um quadro ou ao ler um poema, eles me deixassem indiferente, seria natural que perguntasse para que serviam, por que razão os haviam feito.
Então, se o que estou dizendo tem lógica, devo admitir que quem faz esse tipo de pergunta o faz por não ser tocado pela obra de arte. E, se é este o caso, cabe perguntar se a razão dessa incomunicabilidade se deve à pessoa ou à obra. Por exemplo, se você entra numa sala de exposições e o que vê são alguns fragmentos de carvão colocados no chão formando círculos ou um pedaço de papelão de dois metros de altura amarrotado tendo ao lado uma garrafa vazia, pode você manter-se indiferente àquilo e se perguntar o que levou alguém a fazê-lo. E talvez conclua que aquilo não é arte ou, se é arte, não tem razão de ser, ao menos para você.
Na verdade, a arte - em si - não serve para nada. Claro, a arte dos vitrais servia para acentuar atmosfera mística das igrejas e os afrescos as decoravam como também aos palácios. Mas não residia nesta função a razão fundamental dessas obras e, sim, na sua capacidade de deslumbrar e comover as pessoas.
Portanto, se me perguntam para que serve a arte, respondo: para tornar o mundo mais belo, mais comovente e mais humano.
Sobre o autor
Ferreira Gullar, um dos maiores poetas brasileiros, nascido no Maranhão (1930), é também cronista, ensaísta, teatrólogo e crítico de arte. É autor de livros de poesia como "Dentro da Noite Veloz", "Poema Sujo" e "Na Vertigem do Dia", e de ensaios como "Vanguarda e Subdesenvolvimento" e "Argumentação Contra a Morte da Arte".
Ferreira Gullar, um dos maiores poetas brasileiros, nascido no Maranhão (1930), é também cronista, ensaísta, teatrólogo e crítico de arte. É autor de livros de poesia como "Dentro da Noite Veloz", "Poema Sujo" e "Na Vertigem do Dia", e de ensaios como "Vanguarda e Subdesenvolvimento" e "Argumentação Contra a Morte da Arte".
Nenhum comentário:
Postar um comentário