quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Escolas analógicas, alunos digitais

Publicado em 28.09.2010 - JORNAL DO COMMERCIO
Especialistas afirmam que professores precisam introduzir na sala de aula o modo como os estudantes utilizam recursos tecnológicos como a internet

Rafael Dantas

Tecnologia na educação representa muito mais que digitar os trabalhos escolares e imprimir ou ter uma aula de informática no laboratório da escola. Para os especialistas em ensino, as possibilidades que os diversos apetrechos tecnológicos possibilitam para a vida dos alunos pedem mais que a simples inclusão de novos aparelhos no ambiente de aprendizagem, mas exige uma própria transformação da escola, que atende crianças e adolescentes da geração digital, mas segue com métodos de ensino analógicos.

Para a professora Maria Auxiliadora Padilha, vice-coordenadora da pós-graduação em Educação Matemática e Tecnológica da UFPE, um dos problemas centrais da escola é a falta de interesse dos alunos, gerada pelo distanciamento do ambiente escolar do seu dia a dia. “A vida em sociedade está completamente modificada e, em grande parte, em função dos avanços tecnológicos, mas não vemos essas mudanças na escola, que vai se afastando cada vez mais da necessidade dos alunos, e os alunos se afastam dela.”

Até a forma como os alunos aprendem hoje é estranha para os educadores da era analógica. Enquanto o estudante tradicional se desloca para um lugar silencioso, se concentra e começa a ler, o jovem digital estuda enquanto está fazendo outras atividades. A rigidez das disciplinas escolares e o sequencialismo proposto pelos currículos têm um forte choque com a maneira de aprender dos alunos atuais. “Essa geração estuda com o computador ligado, no MSN, com vídeo, escutando música. Essa é a forma deles se concentrarem e estudarem, enquanto ensinamos para trás, de forma totalmente analógica”, disse Maria Auxiliadora Padilha.

Outro entrave para que a dinâmica da escola seja incluída digitalmente é ainda a resistência de muitos professores, principalmente dos mais antigos, que tiveram toda uma formação analógica. Enquanto os alunos aprendem naturalmente a fazer uso das novas tecnologias, baixando vídeos e músicas ou se relacionando nas redes sociais, os educadores têm imensas dificuldades em aprender as funções dos novos instrumentos de trabalho e, mesmo quando usam para se comunicar ou para resolver questões pessoais, não sabem como aproveitá-las de forma educativa.

Diante das barreiras na aprendizagem do uso das novas tecnologias, o professor do Departamento de Psicologia da UFPE e consultor do Cesar.edu, Luciano Meira, defende que o educador precisa assumir um papel mais nobre que ensinar os alunos a usarem o computador. Afirma que ele deve conhecer as possibilidades de aprendizagem nos novos meios e desafiar o estudante a aprender com elas. “O aluno sozinho descobre como usar o computador. O professor precisa saber os limites de conhecimento que esse artefato pode produzir e dar problemas para os alunos resolverem”, recomenda o especialista.

Para uma utilização adequada e produtiva dos meios, é fundamental que a escola compreenda o que o aluno faz na rede para fazer um uso pedagógico desses espaços. Dentro das lan houses, por exemplo, 43% dos usuários usam jogos digitais e a maioria interage com outras pessoas através das redes sociais, segundo informações do Porto Digital. “O professor precisa compreender sobre como o aluno aprende no ambiente virtual e usar isso como um trampolim para ensinar os conteúdos da escola”, declarou Luciano Meira.

EXPERIÊNCIAS

No meio de um cenário ainda novo para a maioria das escolas, existem diversos esforços para, no mínimo, criar nesse momento uma estrutura e dinâmicas que permitam uma forma mais moderna de aprender, focada no interesse do aluno. O Colégio Apoio teve recentemente um dos seus projetos, integrando informática e matemática, aprovado e apresentado para a Sociedade Brasileira de Educação Matemática. O De cá pra lá... pelas ruas do Recife trabalhou com os alunos diversos conceitos geométricos, com conhecimentos de informática, usando ferramentas da internet, como o Google Earth e alguns softwares educativos.

A inserção da robótica no currículo do ensino fundamental (nos colégios Motivo e Apoio) é outra iniciativa que tem atraído bastante o interesse dos estudantes. Em equipes, os alunos montam os robôs, programam suas funções e fazem relatórios das suas atividades. O Colégio Apoio é bicampeão brasileiro de robótica, numa competição nacional organizada pela Nasa, em parceria com a Lego Education. “Atrelamos a tecnologia utilizada à escola para melhorar a aprendizagem e para desenvolver projetos voltados à sustentabilidade. Foi unindo conceitos de robótica com outras matérias que nossos alunos representaram o Brasil em Atlanta e em Taiwan”, disse a diretora pedagógica Rejane Maia.

A utilização em larga escala da internet em sala de aula, levou o Colégio Motivo a investir em uma rede de fibra ótica para oferecer aos alunos e funcionários do colégio conexão em alta velocidade. Além de projetores e computadores em todas as salas de aula, a escola dispõe de notebooks até para o ensino infantil, a partir dos 3 anos.

“Como temos mais de 500 pontos de rede no colégio, sentimos a necessidade de trazer um sistema que permitisse que todos usassem a internet de alta qualidade. Poderemos fazer até videoconferência com professores de outros Estados”, disse o diretor pedagógico do Motivo, Eduardo Belo, que aponta como tendência para o futuro a disposição das famílias em adquirir e-books para os alunos.

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