terça-feira, 19 de julho de 2011

Letra Cursiva: O início do fim?

http://www.vithais.com.br/
Letra Cursiva: O início do fim?: "
'O ensino da letra cursiva (de mão) será opcional em Indiana e deverá ser banido definitivamente nos próximos anos. A decisão deve ser seguida por mais de 40 estados americanos que também consideram esta forma de escrever ultrapassada. na avaliação deles é mais importante se concentrar no aprendizado das letras bastão (de forma).' [EUA abolem ensino de 'letra de mão', artigo de Gustavo Chacra para o jornal O Estado de São Paulo, publicado em 18/07/11]
Ao ler estas linhas me lembrei imediatamente da canção 'O Caderno', de Toquinho: 'Sou eu que vou seguir você dos primeiros rabiscos até o B, A, Ba...'. Seria o fim dos cadernos também?


Sinal dos tempos dirão os mais realistas. Numa era tão marcadamente tecnológica, com os tablets se firmando ao lado dos celulares 3 e 4G, no sentido de garantir o livre acesso a internet em qualquer parte do mundo e a qualquer momento do dia, para que precisamos de letra cursiva ou mesmo de lápis, cadernos, canetas?


A notícia também me fez recordar o Second Life, que para muitos representa (ou ao menos parecia assim fazê-lo) o futuro da web. Nesta plataforma, só para lembrar, criamos avatares que desempenham nossos papéis nesse mundo virtual. Lembra muito o jogo 'The Sims', apenas que sem objetivos claros, com os participantes fazendo o que quiserem, para o bem ou para o mal, se articulando dentro ou fora dos limites daquilo que podem realizar no mundo real...


Pois bem, me lembrei do Second Life porque os avatares, ao se comunicarem uns com os outros o faziam como se estivessem digitando num teclado imaginário, reproduzindo o que seus pares (ou criadores, ou senhores, como queiram) do mundo real fazem para que eles 'falem' entre si... Será este o nosso futuro? Ao menos é o que os estados norte-americanos parecem estar decretando com a abolição da letra cursiva...


Pensei também na questão da identidade pessoal. Se todos aprendermos a escrever apenas com letras de forma não estaremos abrindo mão de um elemento de caracterização do nosso ser? Psicólogos especializados analisam as pessoas a partir do tamanho de suas letras, da forma como escrevem vogais e consoantes, do espaçamento entre as palavras, do uso mais incisivo de alguns caracteres ou vocábulos nesta grafia...


E os cursos de caligrafia? Certamente serão peça de museu. Chegaremos ao dia em que as pessoas se encaminharão as grandes mostras culturais e artísticas para apreciar (ou depreciar) o fato de que no passado se escrevia com letra de mão... Será que Guttemberg pretendia ou preconizava que algum dia chegaríamos a este momento na história da humanidade?


E os grandes calígrafos ou mestres na arte de produzir textos e letras de hoje e de ontem? E os copistas da Idade Média, que reproduziam a mão os textos dos raros e pouco numerosos volumes do período em que viveram? Todo este trabalho de preservação da memória e, ao mesmo tempo, de esmero artístico, será também motivo apenas de mostras em museus?


Um dos grandes artífices da revolução tecnológica pela qual passamos nas últimas décadas, o ícone da Apple, Steve Jobs, pautou parte de seu trabalho de design e confecção de peças diferenciadas no estudo da caligrafia e das diferentes formas de apresentação do pensamento humanos pelas letras e palavras. Isso incluiu as letras cursivas, não apenas as letras bastão (de forma), ou seja, até mesmo entre homens como ele há a consciência do valor desta produção cultural humana...


Será que o trabalho das autoridades no futuro também não ficará mais difícil tendo em vista que as próximas gerações de americanos, e talvez de outros povos que seguirem esta ação, escreverão apenas através de teclados ou no máximo com letra bastão, para fins de localização, identificação e mesmo responsabilização de seus cidadãos quanto aos seus atos? Tudo bem que poderemos ser rastreados ou reconhecidos pela pupila dos olhos ou pelas digitais, quem sabe até pelas arcadas dentárias ou outros sinais tão particulares, mas não perdemos com isso uma referência tão única e específica, independente da análise de características corporais dos indivíduos?


São questões que se colocam diante desta polêmica iniciada nos Estados Unidos e que já está sendo encaminhada para se tornar realidade e provavelmente padrão dentro dos próximos 40 ou 50 anos...


Pessoalmente sou contra. Não contra a tecnologia e todas as benesses e maravilhas (que sempre devem ser consideradas quanto aos ganhos e perdas que proporcionam). Já uso celulares, notebook, web 3G, Wi-Fi, e-books e tantos recursos que nos últimos anos se tornaram ferramentas básicas da atual geração de cidadãos do mundo. Provavelmente estarei usando tablets e outras facilidades brevemente, mas não quero abrir mão de lápis, cadernos, canetas, borrachas, livros, letra cursiva, letra de forma e outras maravilhas que a humanidade criou antes destes aparatos eletrônicos... E você, o que acha de tudo isso?


Por João Luís de Almeida Machado
Membro da Academia Caçapavense de Letras

"

Nenhum comentário:

Postar um comentário