sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Sebastião Salgado: A Fotografia como arte e crítica social

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Sebastião Salgado: A Fotografia como arte e crítica social:
“Nos seis ou sete anos em que fotografei os trabalhadores, percebi que estamos passando por uma transformação total dos meios de produção. Com o fim da primeira revolução industrial, a chegada de novas tecnologias - das máquinas inteligentes - às linhas de montagem e a nova organização dos fatores de produção, vi que o ser humano e sua vida sedentária tradicional também estão passando por transformações.” [Sebastião Salgado]
De acordo com o Dicionário Houaiss, Fotografia é a arte ou processo de reproduzir imagens sobre uma superfície fotossensível (como um filme), pela ação de energia radiante, especialmente a luz. Trata-se, portanto, de uma técnica que é, ao mesmo tempo, uma arte. E por que esse pormenor é importante?


Porque usualmente pensamos na fotografia como sendo apenas a composição técnica criada pela humanidade para registrar e reproduzir imagens estáticas e permitir que esses enquadramentos se tornem referências, lembranças, notícias, documentos ou ainda arquivos que retratem nossa existência.


Ao elevar o fotógrafo a condição de artista, estamos entendendo que em seu trabalho há também altas doses de criatividade, inteligência, planejamento e conhecimento (do equipamento, das variáveis que podem influenciar na qualidade de suas fotos, das técnicas já existentes para a obtenção de suas imagens...) que tornam sua produção digna de merecer espaço em exposições, livros e museus.


É também necessário esclarecer que nem todas as fotografias que são tiradas atingem o status de obra de arte. Ao tirarmos nossas fotos domésticas, de viagens, de festas, do trabalho ou de qualquer situação cotidiana podemos até, eventualmente, criar uma chapa que mereça essa distinção. O mais comum é que nossos enquadramentos sejam tão usuais e básicos que não mereçam essa consideração...
“Minha maior esperança é provocar um debate sobre a condição humana do ponto de vista dos povos em êxodo de todo o mundo. Minhas fotografias são um vetor entre o que acontece no mundo e as pessoas que não têm como presenciar o que acontece. Espero que a pessoa que entrar numa exposição minha não saia a mesma.” [Sebastião Salgado]
A concepção artística da fotografia é revelada a partir da capacidade que o profissional tem de criar temáticas, explorar variáveis, adotar diferentes técnicas (muitas vezes mesclando-as), utilizar as cores e as luzes da natureza, ser capaz de conceber em estúdio releituras e novidades que diversifiquem sua obra...


Apesar de ser reconhecida como arte no mundo todo, no Brasil a fotografia ainda se restringe enquanto produção cultural refinada e distinta aos círculos intelectualizados das nossas maiores metrópoles ou de cidades do interior de caráter mais progressista. Essas barreiras estão sendo vencidas aos poucos. A compreensão e o estímulo à produção de novos trabalhos têm acontecido e atingido os quatro cantos do país.


Uma das comprovações da pouca expressão do trabalho fotográfico de alto nível em nossa pátria pode ser percebida pelo pouco conhecimento por parte do grande público quanto aos mais expressivos expoentes dessa arte no Brasil. É, por exemplo, inconcebível que a produção de Sebastião Salgado não seja referencial em nossa cultura.


Sebastião Salgado é artista fotográfico renomado internacionalmente e, com certeza, apesar do prestígio que tem em nosso país, é mais reconhecido e respeitado fora do Brasil. Não apenas merece essa valorização pelas técnicas que utiliza em suas produções, que já fazem suas fotografias diferenciadas e merecedoras do status de arte, mas principalmente pelo fato de ter transformado seu trabalho em importante elemento de reflexão sobre os rumos da vida no seu próprio país e no mundo.


Eu acredito que o estilo de vida dos países mais ricos é o estilo de vida certo para todos. Todo mundo tem direito à saúde, educação, previdência social, além do direito e necessidade à cidadania. Acredito que todos os seres humanos neste planeta têm direito às mesmas coisas. [Sebastião Salgado]
Seu trabalho compõe um quadro crítico, que procura provocar o público, dar-lhe matéria-prima para pensar e repensar questões sociais. Não lhe bastava imaginar que sua arte poderia ilustrar (no sentido de ensinar, dar argumento, proporcionar conhecimentos), modernizar concepções ou sensibilizar as pessoas que entrassem em contato com suas fotografias.


Salgado trabalha para que suas obras causem verdadeira comoção entre o público. Para ele a arte tem que levar a engajamentos e lutas. Fotografias podem e devem ajudar a mudar o mundo para melhor. Busca-se com as fotos apresentar denúncias e motivar reações por parte das pessoas, da sociedade civil e, até mesmo, dos próprios governos...


O componente político de sua produção fotográfica torna Sebastião Salgado não apenas diferenciado, mas principalmente polêmico, instigante, provocativo e, acima de tudo, artístico e visceral. Há muita inteligência em sua obra e num país carente de cultura de alto nível como o nosso, sua fotografia é um alento, um oásis em meio a imensas dunas de areia... Nesse sentido é de fundamental importância que entremos em contato com sua produção. 


Espero que tanto como indivíduos, grupos ou uma sociedade, façamos uma pausa para pensar na condição humana na virada do milênio. Na sua forma mais brutal, o individualismo continua sendo uma fórmula para catástrofes. É preciso repensar a forma como coexistimos no mundo. [Sebastião Salgado]
Para Refletir


Tenho a constante impressão de que olhamos, olhamos e vemos muito pouco do que acontece ao nosso redor. Não percebemos o horizonte. Fechamos nossos olhos à natureza. Desprezamos o ser humano que está ao nosso lado. Temos dificuldade para perceber as transformações promovidas pelas pessoas


Ao reeducar nossos olhares acredito que sairemos das cavernas onde estamos inseridos. Atualmente repetimos com grande constância a Alegoria da Caverna do grande filósofo grego Platão. Nosso foco continua sendo o imediato, o aqui e agora e, em muitos casos, apenas aquilo que diz respeito à própria sobrevivência, realização ou sucesso.


O planeta Terra se deteriora ao nosso redor e não queremos saber disso. Pessoas morrem de fome ou vitimadas por epidemias e isso não nos toca nem um pouco. Guerras destroem a água, o ar e o solo e tudo parece muito distante para afetar a nossa própria sobrevivência. O cotidiano nos faz parecer com as ovelhas desenfreadas que Chaplin utilizou em seu célebre filme Tempos Modernos para ridicularizar o mundo contemporâneo e sua pressa.


Ao disparar seu obturador contra acontecimentos que deveriam sensibilizar naturalmente os seres humanos, Sebastião Salgado quer nos despertar desse sono interminável que poderá nos arruinar num futuro muito mais próximo do que imaginamos.


Se não aprendermos a viver de forma a dividir as atribuições, responsabilidades e os frutos de nosso trabalho, é muito provável que destruiremos o planeta e toda a vida que nele existe, inclusive a nossa. Seremos vítimas de nossa própria cegueira, surdez e mutismo.


Iniciativas como as de Salgado e a de outros artistas que devotam seu tempo às causas humanitárias e clamam por uma revisão de nossas vidas e da relação que estabelecemos com o mundo são fundamentais para que consigamos atingir um futuro de paz, harmonia, respeito, dignidade e amor. Só assim o ciclo da vida poderá persistir...




Por João Luís de Almeida Machado
Membro da Academia Caçapavense de Letras

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