Li a matéria postada ontem na revista Piauí e fiquei surpresa com o imaginário da autora. No entanto, lendo a sua biografia, ficou evidente que Raquel Freire Zangrandi sonha em escrever a versão cinematográfica brasileira de 'Entre os Muros da Escola'.
Sendo assim, como professora desta rede há mais de duas décadas, aconselho à produtora de cinema a se interar mais sobre o assunto "educação pública no Brasil".
Não cabe a mim, mas à diretora da referida unidade escolar informar se na escola Acre há uma transgressão às regras impostas pela SME e assinar embaixo desse desvio de sua gestão. Ainda assim, mesmo que isso se confirme através da direção de tal unidade, o que eu duvido, tal relato não pode ser considerado espelho de uma rede de mais de mil unidades escolares.
Como nesta rede de ensino, todos os professores possuem autonomia para gerarem em conjunto o conceito global de seus alunos, reunindo-se em um Conselho de Classe, sendo este de presença obrigatória de TODOS os professores, houve uma notória depreciação à equipe da EM Acre ao se afirmar que o resultado final não condiz com a realidade de seus alunos e muito menos com a vontade dos docentes.
Como professora, garanto que sempre tive total autonomia para atribuir a meus alunos o conceito que lhes fazia jus e caso esse conceito por mim atribuído não estivesse em afinidade com as demais disciplinas, experimentava dois tipos de questionamentos: ou à avaliação feita pelos próprios colegas ou mesmo à minha própria forma de avaliar, dirimindo assim, qualquer tipo de contrassenso.
Informo também que todas as escolas recebem uma verba para reformas que vão desde o predial até o mobiliário. Sendo assim, fica difícil compreender as pichações ainda preservadas e o "rombo" do melanínico. Mas, enfatizo novamente, que mesmo que a afirmação seja procedente, que não cheguemos ao exagero minimalista da generalização.
Ao que me parece, a diretora tem ótimo relacionamento com seus alunos, o que é muito bom em se tratando de gestão escolar. Mas em todas as falas da autora, isso virou sinônimo de permissividade. Segundo ela, até a bebida alcoólica é permitida na escola, desde que devidamente "camuflada". Além disso, sobre a colega Bete ela acrescenta: 'Bete chega à escola a pé, mas se veste para o trabalho como se fosse a uma festa: vestido longo e colorido, sandália de salto, batom, colar, brinco de pingente e pulseiras.' O texto é claro e se estivesse descontextualizado pareceria um elogio, mas na verdade, ali inserido, é um deboche: a autora quis evidenciar que a diretora só se preocupa com a própria aparência e que tal preocupação não se reflete em seu ambiente de trabalho, reeditando sutilmente e com outras palavras, o famoso provérbio: 'por fora bela viola, por dentro pão bolorento' - mas pior, usando para essa construção caricata uma professora com 24 anos de Magistério, formada e especializada. Lamentável!
Da professora Maria Lúcia Martins diz-se que utiliza seu tempo de aula para beber cafezinho, não explica nada, mas cria um vínculo com o aluno na medida em que "usa a roupa que, sem o uniforme, eles (alunos) provavelmente usariam." Pelo menos ao contrário do que ficara subentendido nos primeiros parágrafos, os alunos USAM uniforme!
Pasmei também com o relato sobre o uso da plataforma Educopédia, pois apesar de serem aulas online colaborativas e autoexplicativas, em que alunos e professores poderão utilizar de qualquer lugar e a qualquer hora, não são nem de uso obrigatório em sala de aula e nem têm como objetivo substituir o professor, principalmente se for para "cobrir o buraco" de uma falta deste, que deve sim ser descontada como a de qualquer servidor.
Em nome da classe de professores desta cidade, encerro meu protesto solidarizando-me com todos os colegas envolvidos nessa trama mal elaborada e de péssimo roteiro, que expôs os professores da escola Acre a essa falsa visão vexatória, desmoralizante e depreciativa de seu trabalho que é ao mesmo tempo extensiva a todos os maravilhosos profissionais desta rede!
Parece que na percepção da autora, a única boa professora da escola é Elisa da Costa, que coordena a sala de leitura. Segundo ela, "esta leva o trabalho a sério". As demais não levam o trabalho a sério?
Convido a autora a, se continuar no firme propósito de atrelar sistema educacional à sétima arte, que visite, no mínimo, metade das mais de mil escolas da rede e que busque fazer uma avaliação mais respeitosa dos nossos alunos e docentes. Sim, o Brasil é aqui. Não estamos na França - e isso, em se tratando de educação pública - faz-nos dar graças a Deus!
(Lilian Ferreira - professora da rede desde 1988)
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(Lilian Ferreira - professora da rede desde 1988)
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