FONTE: RADIS
Sensação
frequente de esgotamento, frustração e até vontade de mudar de profissão. Essas
são apenas algumas consequências das falhas estruturais da educação e da rotina
exaustiva dos professores. “Nosso desafio é enorme, mas quando as relações na
escola não estão boas o sentimento é o de nadar contra a maré”, comenta Anne
Pimentel dos Santos, professora há 22 anos — atualmente trabalhando na rede
pública do município do Rio de Janeiro.
Pesquisa sobre violência nas escolas realizada em 2007 pelo
Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp)
com delegados de seu 19º encontro descreve um ambiente de mal-estar, permeado
por desencontros, em que as agressões verbais fazem parte do dia a dia.
“Comportamentos antes vistos como comuns são, agora, encarados como
ameaçadores, provocando medo”, diz o relatório final, que reporta a impressão
de que os conflitos da instituição escolar não podem mais ser tratados
pedagogicamente — o que “reitera a posição de fragilidade e escassa autoridade
dos integrantes do corpo profissional da escola”.
Entre os professores entrevistados,
87% afirmaram ter
ciência de casos de violência ocorridos na escola onde
trabalhavam em 2006. A violência verbal foi a prática mais citada,
seguida por atos de vandalismo, agressão física e
furto: 77% já foram xingados por alunos, sendo que em 23%
dos casos os insultos
são frequentes. Nesse cenário, a saúde do profissional da
educação é
diretamente afetada. Apesar de investigarem grupos
teoricamente distintos,
pesquisas sobre as condições de trabalho dos professores
no Rio Grande do Sul e
em São Paulo indicaram questões semelhantes.
"Quando as relações na escola não estão boas, nosso sentimento é de nadar contra a maré"
Anne Pimentel do Santos, Professora |
Encomendado pela
Federação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino do Estado do Rio
Grande do Sul (Fetee-Sul), o primeiro ouviu professores de escolas particulares
do estado, em 2008 e 2009. A jornada semanal de trabalho dos entrevistados
variava de 25 a 40 horas, mas havia um contingente que ultrapassava as 51 horas
semanais. Era comum que, encerrado o expediente, os professores se dedicassem a
tarefas como preparação de aulas e correção de provas: 70% sempre ou
frequentemente trabalhavam fora do horário.
O estudo de São Paulo
ouviu professores do ensino fundamental e médio da rede pública estadual,
pré-delegados do 23º Congresso da Apeoesp, em 2010. Nesse universo, 32,6%
tinham carga horária de 36 a 40 horas, 30% trabalhavam em duas ou três escolas
e 54% lecionavam para turmas com mais de 35 alunos. O salário bruto
concentrava-se entre R$ 1.201 e R$ 2.400 para mais da metade dos entrevistados.
“Quando o professor
trabalha em várias escolas ou passa o dia todo dentro da mesma escola, não tem
tempo para pensar no seu fazer, quando o magistério exige a reflexão sobre a
prática pedagógica”, observa Anne, cuja experiência no magistério contribuiu
para a elaboração do livro Impactos da violência na escola — Um diálogo com
professores.
Entre os entrevistados no Rio Grande do Sul, 76% sentiram
cansaço ou esgotamento frequente nos últimos seis meses. Mais: 71% tiveram
dores no corpo após o dia de trabalho, 59% apresentaram dificuldade para
dormir, 49% ficaram roucos, 44% sofreram com dores na articulação e 33%, com
enxaqueca. Muitos se disseram estressados (35%), ansiosos (32%) e depressivos
(11%). Esse quadro é característico da Síndrome de Burnout (do inglês to burn out ou queimar por
completo), também chamada de síndrome do esgotamento profissional, comum entre
profissionais da educação.
Mais de 40% dos
professores ouvidos em São Paulo disseram sentir frequentemente cansaço,
sobrecarga, frustração e exaustão emocional em relação ao trabalho, e 77,6%
declararam ter vontade de mudar de profissão, frequentemente ou às vezes. Entre
as situações que mais lhes causavam sofrimento estavam a dificuldade de
aprendizagem dos alunos (75,5%), a superlotação das salas de aula (66,2%), a
jornada de trabalho excessiva (60,1%) e a violência na escola (57,5%). Na pesquisa
do Rio Grande do Sul, registrou-se alto índice de docentes que se sentiam
pressionados, por chefes superiores (35%), chefes imediatos (32%), alunos
(27%), colegas (14%) e pais de alunos (14%). Quanto às situações de violência,
17% dos professores vivenciaram ou presenciaram agressões dentro da escola.
Na avaliação da
pesquisadora do Claves Simone de Assis, os professores não estão preparados
para lidar com esse ambiente opressivo e, por isso, precisam ser capacitados e
estimulados. O curso que coordena na Ensp/Fiocruz é uma das iniciativas que
visam à criação de energia para a ação: ao final dos três meses de aulas, cada
participante desenvolve um projeto estratégico com a finalidade de diminuir a
violência na escola em que trabalha. Mas
Simone ressalva que “o enfrentamento da violência deve ser relacional mas
também estrutural”. n
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