segunda-feira, 7 de março de 2011

Excelência com equidade ou mediocridade para todos?

Excelência com equidade ou mediocridade para todos?: "

Não nos enganemos. No Brasil, mesmo as pessoas com condições de colocar seus filhos em escolas particulares estão expostas aos mesmos determinantes da má qualidade da educação pública e suas consequências, como a desvantagem competitiva no mercado de trabalho global.


Podemos verificar esta afirmação facilmente consultando os relatórios do PISA 2009, esta inesgotável fonte de consulta para assuntos ligados à educação básica, que permite interessantes comparações internacionais.


Como já foi comentado nest blog, nos relatórios do PISA 2009 vemos que o Brasil tem um enorme contingente de pessoas de 15 anos que nem chega a fazer a prova ou que não consegue alcançar o mínimo de entendimento do que foi proposto no exame: 60%. Para piorar, temos apenas um ínfimo coeficiente de pessoas nos níveis mais avançados de conhecimento: apenas 1,3%. A distribuição de renda no Brasil não mostra 60% de miseráveis, o que talvez explicasse este desempenho vergonhoso o PISA. Além disso, temos mais de 10% dos alunos em escolas particulares e só 1,3% com alto desempenho. Então temos que reconhecer: além de desiguais, somos medíocres para educar as próximas gerações – mesmo as escolas pagas pelas famílias não garantem que seus alunos estejam em pé de igualdade com alguns dos países mais desenvolvidos, nos quais o nível de alunos que obtiveram alto desempenho gira em torno de 10%.


Como já perdemos o bonde da opção da educação de qualidade estruturada pela justiça social, resta-nos agora almejá-la sob a pressão da competitividade no mundo dos negócios em escala global para este assunto sair da clausura da pedagogia, passar pelo fórum das análises econômicas e entrar com o pé direito no mundo das políticas públicas competentes e arejadas.


A pergunta que nos fazemos no dia-a-dia é: por que é tão difícil sair do patamar de uma educação medíocre e desigual para alcançar o nível da excelência com equidade?


Em primeiro lugar, porque dá trabalho. Muita gente terá que mudar hábitos, o poder deverá trocar de mãos em muitos lugares e a formação dos professores no Brasil terá que buscar inspiração em países até hoje vistos com desdém e preconceito ideológico.


Assim, para as famílias, a mudança de hábito vai significar o compromisso de que os filhos estejam na escola todos os dias, sem desculpas; de que eles se empenhem nas tarefas de casa, leiam obstinadamente (o que depende muito do exemplo em casa), usem as férias e tempo livre para atividades cognitivas… Enfim, grandes quebras nas rotinas até para quem tem recursos materiais de sobra.


Quando se colocar o interesse e o direito do aluno em primeiro lugar, muitas mazelas brasileiras vão ter que ir para o fim da fila: o patrimonialismo político e sua dinâmica de distribuição de vantagens, o empreguismo do setor público em geral e, em particular nas secretarias de educação, por exemplo. A escolha de fornecedores de insumos, materiais e consultorias passará a ser feita em cima da busca incessante pela qualidade e não pelo personalismo, clientelismo, ou pela simples corrupção.


E para os educadores, embora moralmente revigorante, ministrar uma aula de qualidade excepcional é uma tarefa cansativa: exige preparo qualificado, domínio do conteúdo e das técnicas de ensino, supervisão permanente, planejamento minucioso, avaliação diária e energia nos músculos, cérebro e cordas vocais. Esta profissão vai ter que ser reinventada no Brasil.


Em segundo lugar, é difícil alcançar a excelência com equidade, porque custa caro. Conquistar qualidade mundial em educação no patamar de investimento por aluno que fazemos hoje é uma expectativa absolutamente irreal. Ou repriorizamos os gastos públicos, alinhando a pujança econômica com os gastos sociais, ou cristalizamos de vez o salve-se quem puder pagar, como já acontece, em parte, com a segurança e a saúde.


A consequência de não se aumentar o gasto por aluno naquilo que garante uma sala de aula competente é que quem pode pagar vai fugir da escola pública, aumentando ainda mais a desigualdade social, já que as instituições privadas têm hoje muito mais condições de incorporar inovações para buscar a qualidade em nível mundial que as públicas. Aumentar o gasto por aluno apenas com aumentos de salário para os professores, sem se reinventar a profissão, não só vai atrasar a solução do problema, como vai torná-la mais cara. O investimento indiscriminado em aparelhinhos modernos, como computadores e lousas interativas também só aumenta o gasto, se não vier acompanhado de conteúdo de primeira e no contexto de uma aula bem estruturada.


Em terceiro lugar, porque temos que mudar a ideologia de lugar. Quando a ideologia está no lugar certo, o discurso dominante é que os pobres devem ter oportunidades de educação iguais às dos ricos. Quando a ideologia está no lugar errado, o discurso dominante é que os ricos devem ter educação igual a dos pobres. O lugar certo da ideologia que garante excelência com equidade é no setor público, que tem escala e mandato para garantir oportunidades iguais de educação de qualidade para toda a população. Os piores lugares onde pode estar a ideologia que leva à mediocridade com inequidade são no corporativismo profissional de educadores, no discurso político de quem distribui benesses, ou no atraso acadêmico de quem prepara os professores, mesmo que esteja bem disfarçada.


Com tantos obstáculos para vencer, será que vamos escolher o caminho mais difícil e com mais recompensas (todo mundo com uma educação de alto nível), ou o caminho mais fácil e não muito longe de onde já estamos (quem pode pagar tem uma educação medíocre, mas um melhor do que a dos mais pobres)?

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