Marina Morena Costa, iG São Paulo
Dados servem para calcular merenda e controlar Bolsa Família. Em Praia Grande (SP), crianças usam digital para confirmar presençaFoto: Marina Morena Costa
“Se os funcionários da Prefeitura batem o ponto registrando a digital em um aparelho, por que os estudantes não podem marcar a presença em sala de aula do mesmo jeito?” A partir desta pergunta, o coordenador de Inclusão Digital da Secretaria Municipal de Praia Grande (SP), Marcos Pastorello, iniciou um projeto que está revolucionando as escolas da rede municipal.
Na escola Roberto Mario Santini, para alunos do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, as crianças têm 30 minutos para registrar a presença em um aparelho que fica na entrada da sala de aula. Caso não coloquem a digital, uma mensagem é enviada ao celular de seus pais ou responsáveis, informando que o estudante faltou à escola. Ao final do dia e da semana, os pais recebem um relatório completo, com os horários de entrada e saída dos filhos.
Além de informar aos pais sobre o frequência de seus filhos, os dados servem para garantir a manutenção do Bolsa Família – benefício do governo federal concedido a famílias carentes e condicionado à frequência escolar. “Tivemos problemas com pais que perderam o Bolsa Família e nos acusaram de ter errado no Diário de Classe. Uma mãe chegou a fraudar as datas no caderno do filho para comprovar que ele tinha vindo à escola”, relata a diretora Luciana Nicolosi.
A gestora escolar conta que após a implantação do ponto eletrônico, a porcentagem de alunos faltosos da Roberto Mario Santini caiu de 20% para 5%, segundo a direção da escola. “Agora os alunos não matam mais aula.” O sistema foi implantando como projeto piloto em abril de 2010 e expandido para todas as salas no início deste ano letivo.
Merenda
Eva Célia de Oliveira, merendeira, afirma que o sistema trouxe agilidade e independência ao gerenciamento cozinha. Antes, ela aguardava o inspetor de alunos contar os estudantes presentes em todas as salas para ter uma noção exata da quantidade de comida que deveria fazer. Agora, em 30 minutos, Eva tem acesso ao número de alunos presentes pelo computador instalado na cozinha.
No dia em que a reportagem visitou a escola, 204 alunos estiveram presentes no período da manhã, e foram preparados três quilos de feijão e oito quilos de arroz. No dia anterior, 220 alunos foram à escola, e a equipe de Eva cozinhou um quilo a mais de feijão e dois a mais de arroz. “A diferença de 16 alunos tem um impacto considerável na merenda. Agora o desperdício diminuiu”, diz Eva.
Pastorello espera desenvolver um software que calcule para as merendeiras a quantidade de cada alimento que deve ser preparada, de acordo com o número de alunos presentes. “As funcionalidades são inúmeras”, afirma. Neste semestre, mais cinco escolas da Prefeitura receberão os pontos eletrônicos. A expectativa é de que até 2013 todas as 30 unidades da rede tenham a presença eletrônica.
Fim da chamada
As professoras destacam que os aparelhos reduziram o tempo gasto com a chamada. “Os alunos já estão acostumados, fazem fila para registrar a presença e respeitam a vez do outro”, ressalta Denise Helena dos Santos, professora do 1º ano do ensino fundamental.
Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida, professora da PUC-SP e especialista em tecnologias na escola, vê como positiva a redução no tempo da chamada, que ajuda a otimizar o tempo das professoras em sala de aula. “Não é uma tecnologia pedagógica, mas funcional.”
Os pais aprovam o sistema por questões de segurança e as crianças adoram colocar o dedinho no aparelho e ver o seu nome aparecer. “Se acontecer alguma coisa com o meu filho no trajeto para a escola, ficarei sabendo de imediato. Acho interessante esse sistema que não tem nem em escola particular”, destaca Fabiana Souza de Oliveira, 29 anos, dona de casa e mãe de Nathan, de 8 anos.
O controle de presença por meio da digital instalado na Praia Grande é pioneiro na rede pública brasileira. No Espírito Santo, a rede estadual irá implantar ainda este ano uma chamada eletrônica que será feita pelo professor em sala de aula e registrada em um smart phone ou tablet. Os dados também serão enviados aos pais, via sms.
Controle
A comerciante Sandra Teixera, 46 anos, mãe de Luis Felipe, 6, avalia que este é o “melhor jeito de controlar a frequência que existe”. Najla Ahnedali Zahra, 45 anos, concorda, mas reclama da quantidade de emails recebida da escola. “Acho que é muita coisa”, diz a vendedora e mãe de Thayla, 7 anos. A menina adora a novidade: “É muito legal”.
Como as crianças são menores de idade e estão sob a tutoria dos pais, não cabe a elas aceitar ou não o controle. “Se os pais entendem que é uma medida razoável, não há invasão de privacidade. O controle de presença já era feito, ocorre apenas uma mudança de meio”, explica o jurista Oscar Vilhena Vieira, professor de Direito Constitucional da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).
Vieira destaca que na escola pública não há a possibilidade de escolha dos pais pelo modelo de controle de seus filhos. Ele é imposto pelo Estado. “Os pais podem entender que é inadequado as crianças se tornarem objeto de policiamento e não há possibilidade deles questionarem, dizerem se concordam ou não”, aponta. O jurista pondera que, em processos nos quais a burocracia estatal impõe uma solução, pode ocasionar a “coisificação” do ser humano.
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