29/03/2011
Fonte: Folha
Nós, da Casa da Arte de Educar, queremos fazer parte desta turma que pensa, debate e propõe ações para a construção de um mundo mais justo. Vamos contribuir com posts que vão contar um pouco sobre a nossa experiência em pensar e fazer educação.
Nesta primeira visita, a gente vai apresentar a vocês a Casa da Arte de Educar, que hoje funciona em duas unidades, na Mangueira e no Morro dos Macacos, ambas favelas cariocas.
A Casa nasceu, em 1999, do encontro de educadores populares, moradores do morro da Mangueira, que procuravam soluções para a comunidade, com um grupo de educadores oriundos de uma educação formal de universidades.
Desde então, a Casa é dirigida e coordenada por moradores, com a contribuição das pessoas que não são locais, como eu. Nós entendemos que não é só a comunidade em si que resolve seus problemas, nem somos nós de fora que vamos trazer as soluções prontas.
A solução nasce da pesquisa e da prática dessas diferentes experiências que juntas se fortalecem. Hoje, os profissionais com origem comunitária, que trabalham na Casa, estão formados e com pós-graduação em educação.
Por outro lado, nós que viemos das universidades estamos aprendendo com a prática cotidiana, com a construção dos saberes, com o exercício de entender a educação e a cultura como dois lados de uma mesma moeda.
Entendemos que as diferenças são fundamentais e complementares para a formulação de uma didática intercultural capaz de transformar as diferenças em vantagens pedagógicas. E para construção dessa outra didática, partimos do entendimento de que todo professor é também um pesquisador. Por isso, nossas ações são também reflexões.
O trabalho da Casa da Arte de Educar se organiza em duas frentes: 1) Ações Pedagógicas, por meio da realização de oficinas com diversas práticas educativas; e 2) Pesquisas Pedagógicas que aprimoram a formação dos educadores, com o objetivo de aperfeiçoar e monitorar a Mandala dos Saberes (metodologia desenvolvida pela equipe da Casa).
Nesse contexto, a gente realiza educação integral, com crianças e jovens, além da educação de jovens e adultos, geralmente desenvolvida com familiares das crianças que frequentam a Casa.
Nós estamos estruturados em cinco núcleos:
Pesquisas Artísticas, onde não fazemos questão de gerar artistas ou produto cultural, mas sim trabalhar a arte a partir da linguagem comunitária.
Núcleo da Memória, onde trabalhamos imagens, fotografias, vídeos, construção de texto, para a identificação e resgate das histórias da comunidade.
Diálogos com a Escola, com o objetivo de enfrentar os desafios acadêmicos a partir de nossas experiências comunitárias e de repensar o currículo de forma mais ampla.
Cidade, que nasce da perspectiva de que a gente não aprende só na sala de aula e de que a cidade é em si uma experiência educadora. A gente utiliza a cidade como um livro, com muitas histórias e muitos saberes.
E ainda as Tecnologias Populares, que buscam aproximar o jovem do interesse pela ciência, entendendo que a favela é um espaço maravilhoso de invenção, porque é uma forma de vida com muitos problemas que precisam de soluções.
É por ter uma necessidade que o homem desenvolve alguma tecnologia. A ciência nasce daí. A gente relaciona o conhecimento local com a física, a mecânica etc.
Essa experiência tem sido muito significativa para os moradores da Mangueira e dos Macacos. Nos últimos três anos, nós participamos da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, apresentando vários “professores-Pardais”. Cada invenção traz em si uma possibilidade de diálogo com a ciência.
Nosso objetivo com o trabalho da Casa da Arte de Educar é a redução do quadro de desigualdade na educação brasileira e acreditamos que isso só é possível por meio do desenvolvimento de uma metodologia capaz de aliar, de forma sistematizada, a cultura local ao currículo escolar.
Por isso criamos a Mandala dos Saberes, tecnologia social voltada para a educação integral e capaz de colaborar para o diálogo entre escolas e comunidades, valorizando a integração entre os saberes locais e os saberes acadêmicos.
A metodologia foi selecionada pelo MEC para servir à educação integral do Programa Mais Educação e está sendo disseminada para 10.042 escolas em todo o Brasil.
A gente trabalha há quase 12 anos e por aqui já passaram mais de 5.000 crianças, beneficiadas diretamente. E não vamos parar. O que a gente quer é avançar na questão didática e pedagógica, para garantir que nossas crianças gostem de aprender, e nós, professores, também tenhamos prazer em trocar e construir conhecimento.
Já dizia Paulo Freire: "Ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho, os homens se educam em comunhão”.
Sueli de Lima --educadora e uma das fundadoras da Casa da Arte de Educar.
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