gilberto dimenstein
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31 de janeiro de 2011
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Uma das imagens atribuídas aos judeus é a neurose diante do desempenho nos estudos. Em parte é verdade: são 0,2% da população mundial e 20% dos vencedores do Prêmio Nobel e quase um terço dos matriculados em Harvard e no MIT. Mas isso é pouco com o que viria com os chineses, cerca de 20% dos habitantes do planeta.
Pelo menos é essa a sensação, com certo toque de histeria, que está provocando aqui nos EUA um livro de uma professora de direito nascida na China e casada com um judeu, com quem teve duas filhas.
Amy Chua relata com orgulho a forma rígida com que educa as filhas: nada de TV, videogame ou sair com amigas; são obrigadas a tirar as notas mais altas, exceto em educação física; não têm o direito de escolher as atividades extracurriculares; e devem tocar piano por pelo menos quatro horas por dia.
No livro, intitulado "Hino de Batalha de Uma Mãe Tigresa", o pai, judeu, aparece como alguém mais relaxado e flexível diante da educação das filhas, mas, por causa de um acordo nupcial, acaba cedendo diante do que seria o jeito chinês de educar na base da rígida disciplina.
A tradução para os americanos -e daí a repercussão da "mãe tigre"- é que, com tanta disciplina, os chineses vão dominar o mundo, liderando as inovações. Não vou entrar na questão econômica, mas na pedagógica: excesso de disciplina não combina com criatividade.
O debate em torno do livro reflete o crescimento chinês e a insegurança dos EUA por causa do desemprego. Na semana passada, saiu uma pesquisa, baseada em 200 mil entrevistas, mostrando que nunca os estudantes universitários americanos sentiram-se tão abalados psicologicamente. Temem que seja cada vez mais difícil conseguir uma vaga no mercado de trabalho. Veem os países emergentes, a China em especial, como a grande ameaça.
Some-se a isso que, no último teste internacional de qualidade de ensino, a China ficou em primeiro lugar; os Estados Unidos, em 17º.
A história mostra, porém, que a inovação se sustenta apenas ao longo do tempo em locais onde há não apenas apoio à pesquisa, mas aceitação da diversidade e da indisciplina. O grande personagem de Harvard hoje é Mark Zuckerberg, um gênio indisciplinado na universidade.
Bill Gates não acabou a faculdade; Steve Jobs também não concluiu o ensino superior, onde apenas se interessou por caligrafia.
Não estou dizendo que uma nação não depende de quem estuda duro e é disciplinado, mas sim que se não houver espaço para a fantasia e o delírio não surgem Facebook, Google, Microsoft, IBM ou Apple.
A revolucionária Sony, vista como exemplo do que seria o domínio dos japoneses, é hoje decadente e comandada por um americano. No comunismo, os russos levaram um homem ao espaço, mas não souberam virar um polo de inovação.
Na semana passada, estive num local que serve como a tradução arquitetônica perfeita do poder criativo da indisciplina. É o novo prédio do Media Lab, do MIT, dedicado a descobrir novas funções para a tecnologia da informação.
Não há salas de aulas. Os alunos montam seus currículos, usando outras faculdades. Um amontoado de projetos se espalha pelos andares, parecendo um conglomerado de garagens daqueles jovens inventores que transformam a casa dos pais em laboratórios.
Vemos desde carros cujas rodas encolhem depois de estacionados até um centro de tecnologia da informação dedicado à medicina -no MIT criou-se um departamento apenas para testar o uso da nanotecnologia contra o câncer.
Os grandes inventores precisam de espaço para serem crianças, algumas vezes sem limite, para exercerem sua curiosidade.
O mundo é dividido entre quem cria e quem copia. Os dois tipos são necessários e complementares.
Para ter, porém, muitos inovadores, excesso de disciplina não funciona. Daí o erro, alertado por psicólogos, dos pais que pensam ajudar os filhos reduzindo seu direito de brincar e enchendo seu dia de atividades. Brincar é um dos melhores jeitos de se encantar pelas descobertas.
PS- Viver aqui em Cambridge, onde estão Harvard e MIT, é sentir a disciplina na indisciplina, há uma sensação de que se pode reinventar tudo. Um professor de direito de Pernambuco, Marcos Nóbrega, que está fazendo pesquisas por aqui, resumiu sua experiência numa frase: "Aqui deve ser o único lugar do mundo onde se vai comprar um chiclete e se encontra um Prêmio Nobel na fila".
Apesar disso, há nesse ambiente laureado muito menos formalidade e muito mais flexibilidade e abertura para colaboração do que nas melhores universidades brasileiras.
Pelo menos é essa a sensação, com certo toque de histeria, que está provocando aqui nos EUA um livro de uma professora de direito nascida na China e casada com um judeu, com quem teve duas filhas.
Amy Chua relata com orgulho a forma rígida com que educa as filhas: nada de TV, videogame ou sair com amigas; são obrigadas a tirar as notas mais altas, exceto em educação física; não têm o direito de escolher as atividades extracurriculares; e devem tocar piano por pelo menos quatro horas por dia.
No livro, intitulado "Hino de Batalha de Uma Mãe Tigresa", o pai, judeu, aparece como alguém mais relaxado e flexível diante da educação das filhas, mas, por causa de um acordo nupcial, acaba cedendo diante do que seria o jeito chinês de educar na base da rígida disciplina.
A tradução para os americanos -e daí a repercussão da "mãe tigre"- é que, com tanta disciplina, os chineses vão dominar o mundo, liderando as inovações. Não vou entrar na questão econômica, mas na pedagógica: excesso de disciplina não combina com criatividade.
O debate em torno do livro reflete o crescimento chinês e a insegurança dos EUA por causa do desemprego. Na semana passada, saiu uma pesquisa, baseada em 200 mil entrevistas, mostrando que nunca os estudantes universitários americanos sentiram-se tão abalados psicologicamente. Temem que seja cada vez mais difícil conseguir uma vaga no mercado de trabalho. Veem os países emergentes, a China em especial, como a grande ameaça.
Some-se a isso que, no último teste internacional de qualidade de ensino, a China ficou em primeiro lugar; os Estados Unidos, em 17º.
A história mostra, porém, que a inovação se sustenta apenas ao longo do tempo em locais onde há não apenas apoio à pesquisa, mas aceitação da diversidade e da indisciplina. O grande personagem de Harvard hoje é Mark Zuckerberg, um gênio indisciplinado na universidade.
Bill Gates não acabou a faculdade; Steve Jobs também não concluiu o ensino superior, onde apenas se interessou por caligrafia.
Não estou dizendo que uma nação não depende de quem estuda duro e é disciplinado, mas sim que se não houver espaço para a fantasia e o delírio não surgem Facebook, Google, Microsoft, IBM ou Apple.
A revolucionária Sony, vista como exemplo do que seria o domínio dos japoneses, é hoje decadente e comandada por um americano. No comunismo, os russos levaram um homem ao espaço, mas não souberam virar um polo de inovação.
Na semana passada, estive num local que serve como a tradução arquitetônica perfeita do poder criativo da indisciplina. É o novo prédio do Media Lab, do MIT, dedicado a descobrir novas funções para a tecnologia da informação.
Não há salas de aulas. Os alunos montam seus currículos, usando outras faculdades. Um amontoado de projetos se espalha pelos andares, parecendo um conglomerado de garagens daqueles jovens inventores que transformam a casa dos pais em laboratórios.
Vemos desde carros cujas rodas encolhem depois de estacionados até um centro de tecnologia da informação dedicado à medicina -no MIT criou-se um departamento apenas para testar o uso da nanotecnologia contra o câncer.
Os grandes inventores precisam de espaço para serem crianças, algumas vezes sem limite, para exercerem sua curiosidade.
O mundo é dividido entre quem cria e quem copia. Os dois tipos são necessários e complementares.
Para ter, porém, muitos inovadores, excesso de disciplina não funciona. Daí o erro, alertado por psicólogos, dos pais que pensam ajudar os filhos reduzindo seu direito de brincar e enchendo seu dia de atividades. Brincar é um dos melhores jeitos de se encantar pelas descobertas.
PS- Viver aqui em Cambridge, onde estão Harvard e MIT, é sentir a disciplina na indisciplina, há uma sensação de que se pode reinventar tudo. Um professor de direito de Pernambuco, Marcos Nóbrega, que está fazendo pesquisas por aqui, resumiu sua experiência numa frase: "Aqui deve ser o único lugar do mundo onde se vai comprar um chiclete e se encontra um Prêmio Nobel na fila".
Apesar disso, há nesse ambiente laureado muito menos formalidade e muito mais flexibilidade e abertura para colaboração do que nas melhores universidades brasileiras.
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